Cidade do interior de Goiás tem um médium para cada sete pessoas

Seria o sucesso sinônimo de realização? A ex-modelo Maria Santos chegou longe. Vivia na Europa, como sempre tinha sonhado, mas sentia-se incompleta.
“Comecei a sentir que eu tinha uma missão. E falei: ‘não, eu vou embora’. O meu tempo na Europa acabou e eu tenho que ir para o Brasil, descobrir o que é que eu tenho que fazer”, revela a ex-modelo Maria Santos.
Ela chegou à conclusão que precisava ajudar outras pessoas e decidiu se dedicar a uma de suas maiores paixões: as crianças. “Quando você pensa numa criança, a ternura vem no seu coração”, afirma Maria Santos.
Hoje, Maria é professora voluntária em uma escola de Palmelo, uma pequena cidade no interior de Goiás. E nem sinal das antigas inquietações.
“No fundo, no fundo, se nós somos sinceros com nós mesmos e escutamos a nossa voz interior, nós sabemos tudo”, acredita.
A revelação ocorreu quando Maria tentava resolver um problema de saúde nos ovários. Foi a Palmelo atraída pela fama da cidade, conhecida por ser um centro de cirurgias e curas espirituais.
Ao contrário de muitas cidades que cresceram em volta de uma igreja, a história de Palmelo é diferente. A cidade se desenvolveu a partir de um centro espírita e, hoje, a grande maioria da população vive em função do espiritismo.
São apenas 2,6 mil moradores e um médium para cada sete pessoas.
Quem vai para o centro espírita em busca de atendimento, passa primeiro pelo que eles chamam de raio-x espiritual, uma espécie de diagnóstico que é feito por uma junta de médiuns, liderada por um médium vidente. A equipe de reportagem teve autorização para acompanhar um pouco desse trabalho.
Lázaro Ferreira de Paula é quem conduz os trabalhos. Ele seria capaz de incorporar espíritos que enxergam enfermidades que nem mesmo os visitantes conhecem. “Não é que eu vou ver tudo. Médium nenhum vai ver tudo. Não pode”, afirma Lázaro Ferreira de Paula, médium.
A psicoterapeuta Maria Fernanda, de Cuiabá, ficou impressionada com o que ouviu. “Foi apontado um tratamento no sangue por causa da menopausa. Daí poderia causar também uma anemia, problema na coluna, que eu também estou. A vista e as dores nas pernas que eu tenho sentido, ele falou que é uma varize. E você viu que eu não falei nada”, conta Maria.
Seu Lázaro diz que o dom de se comunicar com o além vem de longa data, da infância, mas ele não podia dividir o que via com ninguém.
“Eu podia passar o que eu passasse com esses espíritos, mas tinha que ser calado, porque senão minha mãe me batia e dizia que eu estava mexendo com almas penadas. Assim que era a língua dela na época”, lembra seu Lázaro.
Mais tarde, os contatos que Lazaro diz ter com os mortos foram ficando tão frequentes que acabaram se tornando públicos.
“Foi um dia que eu encontrei um senhor já desencarnado, um paulista, e pediu para eu dar um recado para a família dele. E nós fomos e encontramos a família. E ela comprovou tudo o que ele falou para mim”, conta seu Lázaro.
Quem vem em busca das chamadas cirurgias espirituais nem precisa sair de onde está hospedado. Em um hotel, eles vão operar a dona de casa Marli Alves de Almeida, de Uberlândia, Minas Gerais. A equipe do Globo Repórter acompanhou passo a passo o tratamento dela.
Ela diz que sofre com dores no corpo e nas pernas. Os médiuns cercam a paciente, fazem orações e colocam as mãos sobre ela.
Marli: A gente vai sentindo que vai fazendo a cirurgia mesmo.
Globo Repórter: é como se estivesse retirando alguma coisa? Cortando?
Marli: Não. Parece que vai limpando onde estão as dores, a doença.
Dona Antônia é paciente antiga. Desta vez, se recupera de um tratamento para a má circulação e dores na coluna. ”Eu senti tanta força nesse tratamento, tantas energias de Deus, de Jesus, que Deus me deu, meu anjo de guarda, que eu sentia certeza que eu ia ser curada”, afirma Antônia Oliveira, dona de casa.
Os médiuns mantêm as convicções espiritualistas, mas reforçam: os tratamentos da medicina convencional são indispensáveis na cura do doente.
Na pousada de Maria Madalena, o pós-operatório espiritual já é quase uma terapia: repouso total, alimentação leve e balanceada e zero de estresse. “A gente busca sempre passar para as pessoas a reforma íntima, a mudança de comportamento. Quantas pessoas com amargura, com ódio, com revoltas, e, depois de um tratamento espiritual, elas mudam os seus comportamentos e, normalmente, mudam de vida”, aponta Maria Madalena Soares, que é dona da pousada e, como já era de se esperar, também é médium.
Como é que se explica um grande número de médiuns em uma cidade tão pequena? Os moradores de Palmelo acreditam que exista sobre a região uma outra cidade espiritual. Seria apenas uma suposição ou estaria aí a explicação para a existência de Palmelo?
A professora Vania Arantes garante que existem cidades invisíveis. Seriam as cidades espirituais. A professora diz que já visitou 20 delas em viagens fora do corpo.
“Eu era levada como se fosse, não é bem um avião, porque ele planava assim de uma forma bem suave, bem próxima. Outras vezes eu me via andando pela colônia, observando os prédios, observando praças”, lembra Vânia Arantes, médium.
A professora Vania é hoje uma das médiuns mais respeitadas de Palmelo. Ela diz que consegue receber mensagens dos mortos enquanto está em uma espécie de transe. É a chamada psicografia.
Diariamente, a professora Vânia responde uma média de 40 cartas de pessoas de todo o Brasil em busca de notícias de parentes e amigos mortos.
“Minha filha Suzane, diante de um momento como este, sinto-me envolvida na doce vibração de seu carinho”, lê Vânia em voz alta.
A mensagem escrita por dona Vânia seria uma resposta psicografada da mãe de Suzane, que morreu há mais de dez anos. Suzane mora em Colombo, na Região Metropolitana de Curitiba, e mandou uma carta para Vânia apenas com os dados da mãe dela e mais nenhuma informação pessoal.
“Tem uns pedaços que é a letra dela mesmo, aonde que ela fala do meu sobrinho Lucas, filho do meu irmão, então, não tem como dizer que não é dela”, considera Suzane Alves de Souza, atendente.
Seria uma simples coincidência? Ou uma mensagem verdadeira? Para Suzane, a grande questão já teve resposta: a carta trouxe um novo alento e um certo alívio à enorme saudade que ela sentia da mãe.
“Para eu poder seguir minha vida, colocar a esperança na frente de tudo e caminhar minha vida, sabendo que ela está bem e que, com certeza, vai estar olhando por mim”, declara Suzane.

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